sábado, 27 de fevereiro de 2010

Façanhas de amigos

Dedicando amizade à nossa família, Antonio Senhorinho dos Santos, o Tonho Gaguinho, com sua forma alegre de levar a vida, participou como ator principal de inúmeras histórias engraçadas e marcantes na vida política de Anápolis e Goiás.

– Do quê vocês mais gostaram na Disney?

Esta foi a pergunta do Tonho Gaguinho, interessado em saber sobre a viagem do André Luís, do Luís Augusto e do Claudio, que acabavam de chegar de Orlando, nos Estados Unidos e conversavam com alguns colegas.

Antonio Senhorinho, o Tonho Gaguinho, presente nas conversas dos meninos, quis saber do que mais haviam gostado naquele passeio.

– Do quê vocês mais gostaram?

– Gostamos mesmo da Casa do Terror!

– Que Casa do Terror é esta?

– Casa do Terror é onde só se vêem assombrações. Não há quem passe por lá que não fique com o cabelo em pé! Dá medo só de ver tanta coisa esquisita!

Quando os garotos saíram, o Tonho resolveu lavar as pedras – de Pirenópolis – do quintal, ao lado da piscina, sempre comentando sobre a viagem dos meninos.

À tarde, ao chegarmos em casa, encontramos o Tonho Gaguinho na calçada, se negando terminantemente a entrar. Procurando saber o motivo daquela atitude ele nos disse que havia alguma coisa estranha na casa. Relatou que ao realizar o serviço de limpeza das pedras um fato assombroso havia acontecido. Conseguiu limpar apenas metade das pedras.

– Que foi que aconteceu Tonho? Perguntou Onaide.

– Quando vocês saíram, fui lavar as pedras perto da piscina, joguei água e sabão em pó, peguei a enceradeira, liguei na tomada mais próxima e fui trabalhar. A enceradeira deslizou no sabão, mas quando a água terminou a enceradeira engasgou e não quis mais rodar...

E por aí foi o nosso auxiliar descrever o problema que enfrentara. Não tinha noção do motivo de a enceradeira grudar na pedra quando faltava água. Para nós o desfecho seria, no mínimo, a queima do motor da enceradeira, mas ele continuou:

– Aí, não sei o que aconteceu, pois a enceradeira ficou grudada na pedra, parou de funcionar e a energia acabou.

Tonho continuou contando que o relógio havia sido desligado, inclusive sendo ouvido um estouro na entrada de energia. Não suportando a carga de energia, a enceradeira travou, provocando o desligamento da chave central da casa. Ligando a chave novamente, a energia voltou em toda a residência e o Tonho voltou para o seu trabalho nas pedras.

Quando voltei ao quintal, disse o Tonho assustado e amedrontado, ainda vi de longe a enceradeira dando voltas pelas pedras e, num pinote, do terreiro mergulhou na piscina. Essa casa é mal assombrada!

Tonho estava tão impressionado com a Casa do Terror descrita pelos meninos que não conseguiu perceber que simplesmente havia deixado a enceradeira ligada e quando a energia voltou, ela disparou a funcionar sem rumo até mergulhar na piscina.

VISITA A RIO VERDE DE CORUMBÁ

Numa outra ocasião, fui convidado por Samuel Costa Araújo, prefeito de Corumbá, para visitar os emedebistas na região do Rio Verde. Levei em minha companhia o Antonio Senhorinho dos Santos – Tonho Gaguinho, companheiro que, apesar de hábitos estranhos e fraco pela bebida, era simples e amigo. O prefeito me chamou reservadamente perguntando-me se Tonho era meu guarda-costas. Sem malícia, não entendendo o sentido da indagação, disse que sim. Quando chegamos ao povoado de Aparecida, mais ou menos metade do percurso que faríamos, paramos para conversar com Celso, nosso líder da localidade, que tinha matado um suíno e estava sapecando a pele do porco, conforme a tradição rural.

Fomos recebidos efusivamente pelo Celso, enquanto Tonho, usando um facão afiado para despelar o animal, cortou o seu rabo ainda chamuscado pelo fogo e começou a mastigar. Samuel, que observava toda aquela cena, intrigado com a ferocidade que Gaguinho mastigava o naco de carne do rabo do porco, apenas sapecado, ficou assustado. Deixando Aparecida rumo a Rio Verde, Samuel Costa Araújo não tirava os olhos do Antonio Senhorinho, que calmamente continuava mastigando o rabo do porco.

Ao chegarmos ao local da festa, já nos esperavam João Paiva, Percílio e outros companheiros. Tonho Gaguinho se entrosou com os organizadores da novena e o papo girou sobre uma briga armada por conta de uma moça do local que deu atenção especial à rapaziada de Brasília.

Com a narrativa da briga, Tonho deu o seu palpite, alertando que numa briga, quem está assistindo corre mais riscos até mesmo do que aqueles estão envolvidos.Tonho Gaguinho aguçou a atenção de todos, contando de uma briga ocorrida no estádio Manoel Demóstenes, em 1964.

– Eu estava no Manoel Demóstenes, quando o Hadão – Haddo Hajar, torcedor fanático do Anápolis, muito forte e que não levava desaforo pra casa, começou discussão com outro torcedor...

– E aí Tonho? Atalhou Samuel, curioso.

– Quando a briga começou, todos que estavam por perto correram. Só eu fiquei ao lado para apartar, caso fosse necessário.

Mais uma vez Samuel interferiu para saber, afinal, o que ocorrera.

– Aí, o Haddo armou o soco. Vi que ele desmontaria o adversário. Quando girou o corpo e soltou o braço direito, o rapaz agachou e o murro acertou minha testa, no que caí sentado.

– E aí Tonho, qual foi a sua reação?

– Fiquei três dias com dor insuportável na cabeça e vendo passarinho cantar o tempo todo.

Samuel não agüentou, soltando um grito de surpresa:

– Êta, segurança macho!

Tonho não entendeu nada da exclamação bem humorada do Prefeito.


POLICIA EM BUSCA DOS BRIGÕES

Como advogado, brilhante pela eficiência e por sua competência, Vicente de Paula Alencar era companheiro inigualável. Foi protagonista de defesas monumentais, corajosas e históricas em favor de injustiçados, durante o regime ditatorial implantado em março de l964.

Ao mesmo tempo era dotado de humor fino e os fatos que com ele aconteciam eram quase que inacrediáveis.

Numa tarde, mal chegado à Anápolis de uma viagem, recebi telefonema do prefeito Samuel Costa Araújo, em busca de socorro para os jovens de Rio Verde que haviam se envolvido em briga com visitantes de Brasília no sábado à noite.

– Adhemar, quando saímos da festa, chegou uma patrulha comandada pelo sargento Silva, da Polícia Militar de Brasília, em busca da garotada. A ordem é para prendê-los. Necessitamos da ajuda do Dr. Vicente Alencar, com urgência.

Fui até a casa do Alencar que estava recebendo a visita de Henrique Silva, partimos os três para Corumbá. Por volta das 20 horas chegamos à residência do prefeito, onde familiares dos brigões de Rio Verde nos aguardavam. Vicente, que carregava no porta-malas do seu Maverick a máquina portátil de escrever, elaborou pedido de habeas corpus e Samuel foi até a casa do juiz que o despachou de imediato. Voltamos e Vicente Alencar nos deixou em nossas residências.

Por volta das 4 horas da manhã ouvi Alencar gritando meu nome no portão de casa. Acordei assustado com sua visita inesperada em plena madrugada. Abri a porta e percebi, pela expressão alegre que trazia no rosto, que não era nada de mais sério. Narrou-me o acontecido, fazendo questão de enfatizar que acabara de sair da casa de Henrique Silva, que foi o primeiro a saber da sua epopéia da noite:

– Quando deixei vocês, percebi que tinha esquecido meus óculos na casa do Samuel, em Corumbá. Fiquei na dúvida se deixava para buscá-lo amanhã, ou se voltava em busca deles. Quando cheguei ao portão de casa, decidi que o melhor era retornar a Corumbá.

E continuou:

– Adhemar, chegando em frente a casa do Samuel, chovia fino e a escuridão era total na praça. Não percebi nenhuma movimentação no interior da casa. Não tive coragem de bater à porta e retornei. De volta, perto de Planalmira, me arrependi de não ter acordado o Samuel, dei meia volta e retornei para buscar os óculos. Na entrada da cidade, em frente ao posto de gasolina, já me preparando para chegar à casa do prefeito, chovia e os vidros do carro eram mantidos totalmente fechados. O calor forte me fazia suar, limpei o rosto com lenço e descobri que os óculos estavam na minha testa. Achei que você e o Silva gostariam de saber em primeira mão esta minha aventura!

Vicente de Paula Alencar foi o principal defensor de perseguidos pela repressão imposta aos democratas goianos após o golpe de 1964. Com competência, coragem e bom humor participou de embates jurídicos monumentais. Enquanto resistiamos no confronto direto com os ditadores Vicente Alencar os enfrentava nos tribunais.

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