sábado, 27 de fevereiro de 2010

Nova Ordem Política em Goiás

- Doutor Rômulo, esta questão para nós não é apenas para defender a legenda do MDB. Estamos empenhados nessa luta para que a justiça seja feita ao Henrique e para evitar que outros possam vir a ser injustiçados.

- Fiquem tranquilos, sou advogado do cidadão Henrique Santillo, que é do MDB.

Esse foi um momento angustiante na nossa vida política, apesar da primeira vitória eleitoral de Henrique.

As principais lideranças políticas do Estado de Goiás haviam sido cassadas e afastadas da política partidária pelo regime ditatorial implantado no país a partir de 1964. Líderes da capital e do interior ligados ao Partido Social Democrático - PSD, sempre prestigiados pelo dr. Pedro Ludovico Teixeira, aderiram imediatamente à Arena, partido oficial do governo federal.

A história política de Anápolis passou a ter um novo ingrediente que alterou profundamente o curso dos acontecimentos a partir de 1966. A espetacular vitória de Henrique Santillo para vereador nesse ano foi o prenúncio de que novos rumos surgiriam na vida política dos anapolinos.

Até então a política no Município era comandanda com vitórias sucessivas pelo coronel Achiles de Pina , com exceção da derrota de seu genro e candidato a vice prefeito Italo Naghetini derrotado por Henrique Fanstone, em 1960.

A Lei Eleitoral da época permitia o voto em separado para prefeito e vice-prefeito, podendo o eleitor votar no Prefeito de uma chapa e no candidato a vice prefeito de outra chapa. Foi o que aconteceu com Jonas Duarte, prefeito eleito pela coligação PSD-PTB e Henrique Fanstone seu vice-prefeito, eleito pela UDN.

Este fato, contudo, não abalou o prestígio do coronel até então o mais destacado líder politico, que elegeria seu candidato a prefeito Raul Balduino na eleição seguinte,em 1965, derrotando Henrique Fanstone.

Neste pleito de l965 Henrique Fanstone, médico muito querido, logo de saída agradou o povão, reunindo pessoas, que em massa, seguiam da Praça James Fanstone para os comícios em diversos pontos da cidade, numa rotina diária impressionante. No início lançando mão das frases de efeito contra o adversário, Henrique Fanstone foi perdendo simpatizantes entre eleitores mais tradicionais. Mas agradava seu fanático grupo de apoio, o que o encorajava a aumentar suas críticas pelo seu jeito franco de falar e de encarar as coisas.

Outro complicador enfrentado por Fanstone foi a decisão dos udenistas que trabalharam e votaram em favor de Raul Balduíno. A posição de Henrique Fanstone na Convenção da UDN a favor de Otávio Lage e contra Emival Caiado, o outro postulante ao governo estadual provocou a retirada de apoio do grupo a Fanstone e foi criado o chamado “Comitê do Meio”, apoiando Otávio Lage para o governo e Raul Balduino para a prefeitura em Anápolis.

O candidato do PSD, Raul Balduíno médico, também muito conceituado, era ligado à classe média e setores mais ricos da sociedade

A campanha que no início era francamente favorável a Fanstone, chegou na reta final bastante equilibrada. Quando os votos foram apurados nos distritos de Joanápolis, Interlândia, Rodrigues Nascimento, Goialândia e setor central de Anápolis, Henrique Fanstone estava com algumas dezenas de votos à frente de Raul Balduíno. Contados os votos de Souzânia, Raul Balduino não apenas tirou diferença como venceu o pleito por 222 votos de frente. Ficava mais uma vez em posição de destaque junto ao eleitorado anapolino o cel. Achiles de Pina

Na eleição seguinte para Câmara Municipal, uma supresa mudou completamente o cenário da política local com a eleição de Henrique Santillo que obteve a maior votação já vista no município.

Mesmo tendo passado sua vida em Anápolis até o ensimo médio, científico na época, depois disso ficara vários anos fora cursando medicina em Belo Horizonte. Adepto de pensamentos socialistas de esquerda, Henrique engajou-se na política logo que retornou à cidade. A sua eleição assustou os adversários que passaram a usar dos mais sórdidos expedientes para impedir sua diplomação, inclusive forjando documentos apócrifos, como se fossem enviados pelo SNI com acusações caluniosas e difamatórias.

A princípio conseguiram êxito na trama pois contaram com apoio decisivo do Juiz Eleitoral de Anápolis que aceitou a denúncia e se negou a diplomá-lo vereador. A papelada montada de última hora sem qualquer autenticação ou timbre de instituição, alegando que Henrique era fichado no G2 da PM de Belo Horizonte, era uma farsa tão escabrosa que foi desmacarada com uma certidão negativa que pessoalmente busquei no citado órgão militar, imediatamente após a negativa de diplomação.

Sofri junto com meu irmão e toda nossa família até a consumação da sua diplomação, o que aconteceu em abril do ano seguinte, quando o Tribunal Regional Eleitoral do Estado, apreciando o processo em grau de recurso, reformou a sentença do dr. Manoel Luiz Alves, considerando os documentos apresentados pelos denunciantes como inconsistentes diante da certidão negativa do G2 da Policia Militar de Minas Gerais.

A defesa de Henrique no TRE foi feita pelo advogado Rômulo Gonçalves um dos mais renomados defensores de presos políticos em Goiás e as despesas com a tramitação do processo foram bancadas pelo nosso pai, com os pequenos recursos financeiros que dispunha.

Enquanto essa trama contava com total apoio do Palácio das Esmeraldas e o comando político arenista de Goiás, nem o próprio MDB se manifestava contra a arbitrariedade. Pelos recentes desdobramentos causados pelo regime militar instalado a menos de dois anos, poucos se dispunham a constestar atos arbitrários. Havia um receio, mesmo entre os emedebistas, de defender alguém acusado de comunista, o que representava naquela época um crime inaceitável. Assim, além dos adversários partidários enfrentamos a omissão e falta de solidaridade das forças tradicionais do próprio MDB, que não nos reconheciam como militantes politicos, visto nosso recente ingresso na política partidária. Lutamos sozinhos pelo mandato de vereador do Henrique porque a preocupação maior do partido era assegurar que os votos fossem aproveitados para a legenda do MDB.

Romualdo e eu tomamos a frente para ajudar nosso irmão e não medimos esforços em procurar a bancada emedebista da Assembléia Legislativa , conseguindo apoio dos deputados estaduais Eurico Barbosa e Iturival Nascimento que usaram a tribuna denunciando a perseguição política que Henrique estava sofrendo. Foi a manifestação de solidariedade dada pelo MDB estadual ao episódio.

Essa ausência de apoio fêz com que procurássemos o advogado Rômulo Gonçalves para alertá-lo:

- Doutor Rômulo, esta questão para nós não é apenas para defender a legenda do MDB. Estamos empenhados nessa luta para que a justiça seja feita ao Henrique e para evitar que outros possam vir a ser injustiçados.

- Fiquem tranquilos, sou advogado do cidadão Henrique Santillo, que é do MDB.

Fizemos esse alerta ao dr. Rômulo Gonçalves por uma preocupação que o acaso nos propiciou.

Procurando envolver o maior número de autoridades para expor a arbitrariedade cometida contra um representante do povo, legitimamente eleito, resolvemos procurar um desembargador de Anápolis, dr. Jorge Salomão.

Formalmente nos apresentamos no seu gabinete noTribunal de Justiça. Ficamos aguardando na ante-sala e enquanto esperávamos pelo seu atendimento ouvimos a argumentação de dois líderes do MDB anapolino ao desembargador, onde afirmavam:

- Quanto a isso o Tribunal Superior Eleitoral já possui jurisprudência. Cassa-se o mandato do comunista mas os votos ficam para o partido.

Saimos dali mesmo, sem sermos percebidos, direto para o escritório do dr. Rômulo Gonçalves levando informação da conversa ouvida, que demonstrava pouco interesse para defender o Henrique, desde que os votos ficassem com a legenda.

A vitória de Henrique no Tribunal Regional Eleitoral, TRE e sua posse como vereador abriram caminho para novos rumos na política de Goiás.

Na eleição de 1966 o povo atropelou as tradicionais lideranças políticas de Anápolis consolidando, com antecedência, a candidatura de Henrique Santilo à sucessão de Raul Balduino.

Reconhecido pela sua visão socialista e idéias progressistas, Henrique encontrou respaldo em companheiros do MDB para se candidatar a prefeito na eleição seguinte. Com apoio decisivo do deputado Anapolino de Faria, teve condições necessárias e indispensáveis para vencer os conservadores que lutavam em favor da candidatura Thales Reis, também pelo MDB à prefeitura.

Era o ano de l969, quando seriam eleitos os novos prefeitos que substituiriam aqueles que haviam sido eleitos pelos partidos politicos criados na década de l940. A exemplo da eleição anterior onde dois partidos disputaram a preferência do eleitor, o pleito de l969 seria disputado com dois candidatos , representando Arena e MDB.

Em Anápolis o nome preferido da cúpula emedebista era o de Thales Reis, delegado de polícia, genro do cel. Achiles de Pina, até então a maior liderança política do município.

Realizada uma reunião por iniciativa do jornalista Moacyr Junqueira, editor chefe do jornal O Anápolis e assessor politico do deputado federal Anapolino de Faria, lideres do MDB, como o advogado Lincoln Xavier Nunes e professor José Batista Júnior, elaboraram documento em nome dos integrantes do diretório municipal apoiando a candidatura de Henrique Santillo à sucessão de Raul Balduíno.

Em pouco tempo o nome do Henrique, como médico e vereador mais votado em Anápolis na eleição anterior, contagiou as camadas populares.

Henrique, contudo, não aceitava a idéia de se candidatar a prefeito.

Foi quando, mais uma vez, Moacyr Junqueira e demais líderes do MDB se reuniram lançando, desta vez o meu nome à prefeitura pelo MDB, caso Henrique não aceitasse ser candidato.

O assunto foi matéria na edição do dia seguinte, quando o jornal O Anápolis trouxe em sua principal manchete “Adhemar Santillo poderá ser o candidato do MDB”.

Sobre este episódio histórico, em entrevista concedida à Rádio Manchester AM 590, em agosto de 2007, José Batista Júnior, comentou:

- Como Henrique Santillo não se dispunha a ser o candidato a prefeito no pleito de l969, decidimos que nosso candidato seria Adhemar Santillo. Lamento que Moacyr Junqueira e Linconl Xavier não se encontram mais entre nós para confirmarem o que falo. Os arquivos do jornal O Anápolis , do ano de l969, podem comprovar nossa decisão.

José Batista Jr. acrescenta:

_ Indicamos Adhemar Santillo porque, mesmo muito jovem, já era grande lider em Anápolis. Adhemar sempre foi o desbravador, o trator que abria o caminho e pavimentava a estrada para Henrique Santillo executar o trabalho. Romualdo, o mais novo dos irmãos, sempre trabalhou na retaguarda, fazendo o trabalho intelectual. O pára-choque da familia sempre foi o Adhemar. Com êle nunca houve missãõ dificil ou impossível. Sempre foi “pau para toda obra”.

Devido a nossa insistência e de todos companheiros Henrique aceitou ser candidato a prefeito. Com espírito conciliador e sem objetivo de isolar ou sufocar seus adversários dentro do partido, escolheu para companheiro de chapa Thales Reis.

A vitória dos emedebistas foi extraordinária em 1969, com o dobro dos votos do seu concorrente, Luiz Vieira, vice prefeito de Anápolis e que se candidatara pela Arena. Estava desenhada, com a maior nitidez, uma nova ordem política em Goiás daí em diante.

Neste período ditatorial de 64, os goianos eram conhecidos como autênticos, combatentes e corajosos, ao lado dos emedebistas de Pernambuco e do Rio Grande do Sul,

Em Anápolis, com vitórias que conquistamos nas urnas e destemor que tínhamos no exercício dos mandatos, este conceito se justificou. Foi o fim da política provinciana, coronelista, tradicional pela prática democrática sob o comando de Henrique Santillo.

Anápolis deixou de ser uma cidade politicamente inexpressiva onde o coronelismo ditava as ordens, para dar espaço a um seleto grupo de democratas brasileiros, idealistas, persistentes, que tanto fêz para o retorno do estado democrático de direito.

No registro da história de combate direto e constante à ditadura implantada no país a partir de abril de 1964 até a vitória deTancredo Neves e José Sarney em l985 , a redemocratização do Brasil tem um capítulo especial que mostra a luta do povo goiano e do Movimento Democrático Brasileiro em Anápolis, através dos seus líderes.

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